O acesso a absorvente
O programa Dignidade Menstrual é fruto do projeto de lei nº 10.072/21 apresentado na época pela vereadora e atual deputada federal Camila Jará (PT). O projeto, inicialmente voltado à distribuição gratuita de absorventes em unidades de saúde e escolas municipais para mulheres em situação de vulnerabilidade, foi vetado pelo ex-prefeito Marquinhos Trad. No entanto, o projeto foi readaptado e institucionalizado pela Lei nº 6662, garantindo que a proposta fosse implementada nas escolas municipais.
Embora sancionado em 2021, o programa só se tornou realidade dois anos depois. Segundo a chefe da Divisão de Acompanhamento e Apoio Escolar da Secretaria Municipal de Educação (SEMED), Mônica Cristina Silvano, o atraso ocorreu devido às dificuldades impostas pela pandemia da COVID-19, que impossibilitaram a execução imediata do projeto. “A pandemia ocasionou uma série de limitações em termos de recursos, logística e planejamento, o que nos forçou a adiar o início do programa” , afirma.
Com a estabilização do cenário e o retorno das atividades presenciais nas escolas, o programa pôde finalmente sair do papel. Em apenas um ano de atuação, já apresenta números expressivos: De acordo com dados recentes do portal da transparência, programa atende atualmente mais de 8.452 estudantes, com idades entre 11 a 55 anos das 69 escolas da rede municipal, do 5º ao 9º ano do ensino fundamental II.
Para Mônica Silvano, o programa não se limita a fornecer absorventes. Ele é uma resposta para alunas em situação de vulnerabilidade que, além de não terem acesso a produtos, possuem pouco conhecimento sobre saúde menstrual e muitas das vezes enfrentam a puberdade sem nenhum apoio necessário. "Nós atendemos diversas comunidades em situação de vulnerabilidade. São crianças e adolescentes que chegam à fase da adolescência, da puberdade, sem grandes informações. Muitas meninas vivem em condições de risco, em casas sem condições básicas de higiene. Elas entram na menstruação sem saber como lidar, seja por falta de orientação familiar, seja por vergonha de pedir ajuda.”
Mônica Silvano também explica que o programa formalizou uma prática que já existia, embora de forma improvisada. Ela recorda que os professores e outras coordenadoras se organizavam para ajudar as alunas como podiam. ‘’Nós deixávamos um pacote de absorventes na sala da coordenação para atender aquelas meninas que precisavam”, relata. “A escola, muitas das vezes, comprava os produtos com recursos próprios, ou as professoras traziam de casa. Naquela época, sabíamos que essa era uma necessidade real e que não poderia ser ignorada “.
Para realizar a compra dos absorventes, a Secretaria Municipal de Educação (SEMED) realiza um levantamento do número de adolescentes matriculadas do quinto ao nono ano, com idades entre 11 e 55 anos, que correspondem à média da menarca ao início da puberdade. Com base nesses dados, é calculada a quantidade de absorventes que será adquirida. Após a conclusão da compra, os absorventes são enviados para as escolas.
“A licitação e a compra dos absorventes são baseadas no número de meninas que temos nessa faixa etária. Após finalizada toda essa etapa, entramos em contato com as escolas para verificar se os números conferem e se realmente existe essa quantidade, garantindo que a distribuição atenda ao número de alunas”, explica Mônica.
Para enfrentar esse problema, o programa foi implementado com o objetivo de estabelecer uma política pública que garanta às alunas acesso contínuo aos absorventes, tanto nas escolas quanto em suas casas. Em 2022, a Semed por meio da Prefeitura deu o primeiro passo para transformar em realidade o acesso a absorventes. Foram destinados cerca de R$331,1 mil para a compra de 63.189 unidades de absorventes, cada pacote custando no valor de R$5,24 . Em 2024, um novo processo licitatório mostrou avanços: com um orçamento de R$359 mil, a secretaria conseguiu adquirir 92.980 unidades a um custo de R$3,87 cada.
Se as famílias comprassem esses absorventes na farmácia o preço sairia mais em conta - um pacote de 16 unidades sai em média R$16,00, ou R$0,62 a unidade e com qualidade superior - daria para adquirir seis absorventes na farmácia pelo preço de um pago pelo poder público. O problema é que as famílias não têm recursos para comprar.
Para garantir que não faltem absorventes para as estudantes, a Semed realiza, anualmente, um levantamento do número de alunas matriculadas do quinto ao nono ano, com idades entre 11 a 55 anos – faixa etária que abrange, em média, desde a menarca até o início da menopausa. Com esses dados, a secretaria calcula a quantidade necessária de absorventes a serem adquiridos para atender a todas as alunas de forma adequada. Após a conclusão da compra, os absorventes são distribuídos para as escolas, onde cada equipe de coordenação estabelece um sistema apropriado de entrega para que cada estudante receba o item de maneira organizada.
O programa, inicialmente, destinava-se a atender apenas alunas cujas famílias estavam inscritas no programa Bolsa Família .Contudo, Mônica Cristina Silvano, explica que o projeto foi ampliado para beneficiar todas as meninas que necessitam dos itens de higiene menstrual.
"Hoje, disponibilizamos absorventes para todas as alunas, sem qualquer distinção. Fazer uma separação de quem deve receber ou não, seria como categorizar as meninas, sugerindo que algumas são mais necessitadas, por isso, merecem ajuda, enquanto outras não. Portanto, essa abordagem não condiz com os valores de respeito e inclusão que buscamos promover", ressalta Mônica.
Segundo Mônica, o objetivo é que as meninas se sintam totalmente à vontade para retirar os absorventes na escola, sem que sua condição social seja um fator de impedimento. "Queremos garantir que todas tenham liberdade para acessar esse recurso, sem nenhum tipo de constrangimento ou discriminação", afirma Mônica.
Ela explica ainda que o programa busca evitar qualquer tipo de rotulação ou julgamento: "Não queremos que a menina sinta que precisa pegar o absorvente às escondidas, expondo sua vulnerabilidade social e econômica. Esse não é o nosso propósito, os absorventes são disponibilizados para todas as adolescentes dentro da faixa etária atendida, permitindo que cada uma tenha a autonomia de pegar quando precisar."
A iniciativa vai além da distribuição de absorventes: ela se propõe a promover conscientização com uma abordagem acolhedora e sensível, educando meninas e meninos sobre o ciclo menstrual, a importância da higiene corporal e dignidade e pobreza menstrual. Além disso, também busca desmistificar tabus e mitos em torno do tema esclarece Mônica.
O programa dedica atenção especial às meninas de 10 e 11 anos, que estão começando a vivenciar a menstruação e precisam de apoio adequado para essa fase inicial. Mônica Cristina Silvano destaca que muitas alunas dessa faixa etária estão enfrentando esse momento pela primeira vez, o que torna urgente a necessidade de uma educação menstrual acessível.
“É fundamental que essas meninas recebam informações claras sobre o que é a menstruação e como cuidar da higiene de forma correta. Queremos que elas não apenas entendam as mudanças que estão passando, mas que também saibam se proteger, evitando desconfortos e problemas de saúde,” explica Mônica.
Chefe da Divisão de Acompanhamento e Apoio Escolar da Secretaria Municipal de Educação (SEMED), Mônica Cristina Silvano.
Segundo ela, essa conscientização é essencial para que as alunas desenvolvam uma relação saudável com seus corpos, sem estigmas, fazendo do ambiente escolar um espaço de apoio e acolhimento nessa fase de tantas descobertas. Para que as palestras e rodas de conversa sobre saúde menstrual aconteçam, foi estabelecida uma parceria com a Secretaria Municipal de Saúde (Sesau), que disponibiliza profissionais como médicos, psicólogos, enfermeiros e técnicos de enfermagem.
Além disso, as escolas também têm a liberdade de desenvolver essas atividades em conjunto com suas equipes de coordenação pedagógica, contando com o apoio de orientadores educacionais.‘’Esse trabalho é considerado um eixo complementar no currículo das escolas, permitindo que o tema da menstruação seja abordado de maneira consistente e respeitosa. Diversas parcerias são realizadas: em algumas ocasiões, psicólogos são convidados a conversar com os alunos; em outras, a Sesau envia enfermeiras e técnicos de enfermagem para participar das discussões.
Já houve também a presença de médicas que realizaram palestras, explicando como funciona o ciclo menstrual e enfatizando a importância de cuidar e respeitar esse processo, tanto para meninas quanto para meninos ", acrescenta Mônica. Essas colaborações são fundamentais, pois muitas escolas ainda contam com orientadores educacionais que se dedicam a orientar os alunos sobre saúde e bem-estar.
Algumas instituições utilizam seus próprios orientadores, enquanto outras buscam parcerias com diferentes órgãos, garantindo que todos os estudantes recebam uma educação abrangente e inclusiva sobre a saúde menstrual. Para Mônica Silvano, o programa foi criado para dar voz a uma vulnerabilidade específica das mulheres.
Ela enfatiza que muitas vezes essa vulnerabilidade é velada, passando despercebida no cotidiano. “A vulnerabilidade existe e precisa ser reconhecida. Este programa tem como objetivo abordar essa questão específica, oferecendo um cuidado que consideramos essencial, especialmente neste momento em que se busca a valorização da mulher e se discute as leis que têm favorecido seus direitos.”